terça-feira, 20 de julho de 2010

Revendo a crise do macho em "Sobre meninos e lobos":

Acabo de assistir novamente Sobre Meninos e Lobos. e Re-confirmo duas questões

1ª Odeio o final do filme [para mim ele acabaria na connversa de Kevin Bacon com a mulher.

2º Continuo achando que o centro da discussão da obra é a crise do Macho.


Se me perguntassem de que se trata o enredo do filme “Sobre meninos e lobos” eu diria: “é um filme que fala sobre homens tentando elaborar a experiência da dor”. Ontem pela primeira vez (re-)assisti a esse filme. E confesso que adiei durante um certo tempo, fingindo não vê-lo na prateleira da locadora. A narrativa conduzida por Eastwood por trás das Câmeras, para além de um roteiro que fala sobre família, amizade, infância perdida trás uma outra questão que se impõe e ultrapassa o mero pano de fundo: A narração estetizada da crise do Masculino. Há neste sentido uma metanarrativa. Ou ainda uma metadireção.

Entretanto trato a “crise” aqui, palavra cara aos nossos tempos, não no sentido apenas trágico e menos ainda no sentido anti-trágico-espetacularizado como o termo vem sendo apropriado na contemporaneidade. Mas a “Crise” aproximada ao sentido atribuído por Walter Benjamim, a saber, o moderno é a crise e não apenas no sentido econômico e político mas também filosófico.

Logo, não se trata aqui de discutir algumas surradas banalidades apropriadas pela mídia como: metrosexualidade, a síndrome de Peter Pan ou Remédios para disfunção erétil. O que parece estar subtendido no cinema produzido por Eastwood é um “sinal” de um Tipo masculino contemporâneo cada vez mais freqüente: o homem “durão” que começa a elaborar “cinematograficamente”(no caso de Eastwood) sentimentos que lhe foram historicamente interditos. Eastwood passeia com segurança por dimensões afetivas do Self made Man explicitando por vezes a ausência de signos e códigos que poderiam mediar as emoções e situações de sofrimentos experimentados por seus personagens masculinos. Simultaneamente a isto o diretor empreende uma estética narrativa extremamente sensível sem cair em “delicaderismos” que poderiam soar artificial. Traduz aí a descentralização falocêntrica da sociedade ou mais especificamente a permissão à vivência da dor. Lembremos da Conversas do Personagem Jimmy e o seu Sogro. Um diálogo incômodo onde os dois se acusam e questionam acerca dos sentimentos vivenciados diante da perda de filhas. É nesta cena específica onde o personagem de Sean Pean coloca de lado a figura do genitor-que-deve-dar-suporte-ao-resto-da-família e se auto-autorizara ao sofrimento diante da perda. Ou poderíamos destacar ainda as cenas de Tim Robins atormentado pelas lembranças das violências sexuais vividas na infância e o Personagem de Kevin Bacon que passa o filme todo recebendo ligações mudas da mulher que o abandonara a seis meses.

Como ficar indiferente diante da dor de Jimmy ao perceber que o corpo no Parque era o de sua filha? Mas o diretor vai além dessas (importantes) evidências. Todo o filme é costurado por uma ausência de signos diante de uma realidade que se transmutou consideravelmente em vinte anos: a do universo masculino como provedor material e emocional do lar. Percebemos isto muito mais nos corpos dos personagens que propriamente na transmutação do cenário da infância em adulto. Neste sentido o distanciamento entre os três amigos de infância traduz a centralidade desta metáfora: São três Homens Chefe de Família e desolados, levando suas existências, tateando. É aqui que a poeticidade da fotografia e da direção lançam mão das “pequenas” evidências desta crise do masculino. Este “novo” homem aparece não mais como o Porto Seguro em posturas austeras, inabaláveis diante do trágico. Ao contrário, as câmeras passeiam registrando os berros, choros, convulsões e silêncios. Com a ajuda dos típicos “closes” holiwoodianos vemos que os personagens não é nem o super homem nietezchiano, nem tão pouco adotam uma transcrição mecânica dos melodramas historicamente rotulados como femininos para o universo masculino. O sucesso de Eastwood parece estar neste ponto. Na tradução do não-gesto, da ausência de mediações, do trucado, da fúria que explode diante do inevitável e do indizível.

Não se trata portanto, também de proclamar o desaparecimento do “macho” mas, volto a dizer, trata-se sobretudo do flagrante promovidos pelas câmeras diante da tentativa de elaboração sentimental. Esta tese se confirma em uma das cenas finais onde o Personagem de Kevin Bacon recebe o último telefonema da esposa e ao invés de pedir explicações acerca de seu paradeiro, lhe pede desculpas e admite o erro. Neste momento ela finalmente fala. Ou seja. Há a tradução lingüística de sentimentos e a comunicação enfim é estabelecida.