Fui assistir semana passa “pecados da carne”(2009). Como dá pra ver, esses filmes costumam ter os títulos apelativo-idiotas no português para chamar público; em inglês: Eyes wide open”
O filme não empolga muito. Demora um pouco a engatar. Se é que engata. E acaba valendo por ser uma peça de ficção bacana que aborda a temática homoafetiva dentro de uma judia ortodoxa em Israel.
Enquanto assistia o pensamento mais relevante que tive nem foi em relação à intolerância do “queer” mas sim o quanto a obra Freudiana “Mal estar na civilização” ainda nos tem a dizer qdo o assunto é a díade irreconciliável: Segurança ou liberdade?
Ansiamos pelos dois mas, uma é a condição da ausência do outra.
O sociólogo polonês Zygmunt Bauman captou isso muito bem [embora eu ache a escrita dele muito jornalística] e fez fortuna. Em especial com os livros “Amor líquido” e “Comunidade”. Neste último ele aborda como os agrupamentos humanos são desejados e protetores. Contudo a condição de permanência sob a proteção deles é abdicar da liberdade. Entra-se ai no nível do “dar satisfação” ou, se quisermos radicalizar na intelectualização, no nível da “performatividade”social [Vide Butler e Yúdice] ou da internalização de um habitus como ta bem demonstrou Pierre Bourdieu.
Nese contexto o final é bem previsível. Mas não vou dizer aqui.
terça-feira, 29 de junho de 2010
quarta-feira, 23 de junho de 2010
Desventuras de um Dono de Casa
terça-feira, 22 de junho de 2010
Foucault sob o crivo dos Barbudos
Para rebater a leveza da atual leitura dos diários de Antônio Bivar, leio também a tese de Doutorado de Mavi Rodrigues: “ Foucault sem espelhos: um pensador proto pós-moderno.”
Totalizante, racionalista, uma rocha são características do texto da escritora. Mavi deve no mínimo ter o ascendente em capricórnio. Mudéééérrrrna até a última linha a escritora nos fornece uma leitura extremamente original de Foucault quando passa as teses do escritor francês sobre o crivo do Marxismo ortodoxo
Leio a tese de forma suspeita. Não recomendada: fragmentada. Não agüento esperar pelos capítulos III e IV, vou e volto nas páginas. Um estudo sério, de cachimbo e tensão nas sobrancelhas. Mas nem só de adjetivos e metáforas vive uma tese de doutorado. Então vamos lá às impressões:
A tese central é meio obvia: Foucault foi um autor precussor do que a tradição marxista tem chamado de “irracionalismo pós-modernista.”
Já o recheio não é nada trivial: Mavi constrói a argumentação a partir de uma proposta, como já disse, nada comum em que se tenta atribuir uma unidade ao pensamento de Foucault. Uma verdadeira heresia para os seguidores do autor de “A palavra e as coisas” e também para o próprio Foucault. Mas a argumentação da doutoranda se sustenta perfeitamente dentro da proposta do sistema de pensamento crítico-dialético.
O que agrada: Um trabalho com unidade [quase] impecável. Coisa rara nos dias atuais. Esta parece ser uma das maiores e melhores características dos auto-intitulados jurássicos seguidores de Marx. Uma analise totalizante [e portanto inédita, até onde eu sei, pois refuta rupturas epistemológicas no interior daquele pensamento] das três fases do escritor: a da arqueologia do saber; da genealogia do poder; e da ética da existência [ou da hermenêutica do sujeito].
Crítica ao fórum social mundial
O que desagrada: nas considerações finais não fica devidamente demonstrada o nexo entre o objeto de estudo [o pensamento de Foucault] e as determinações gerais do pensamento pós-moderno hoje nos chamados novos movimentos sociais. Parece um tanto megalômano achar que Foucault determinou os rumos daqueles movimentos. Embora neste momento a análise da autora continue sendo bastante interessante e fundamentada (destaque para a utilização de Mandel para sustentar as argumentações) as considerações finais ficam deslocadas. Parece que estamos diante das conclusões de outro estudo. Até coloquei no “search” do Adobe para ver a última vez que Foucault é citado. O filósofo francês simplesmente desaparece e quando seu nome é abordado eventualmente nas páginas finais é feito de forma deslocada e às vezes até primária. Contradizendo o robosto texto que se apresentara até então.
Enfim, Mavi desestabiliza Foucault da maneira menos provável: estruturando-o. Você pode até não concordar com o que ela diz, mas como aquariano tenho certeza que esta obra não deve ficar apenas nos mofados arquivos cibernéticos da capes. Ela deve ganhar o mundo. E que venham as polêmicas.
segunda-feira, 21 de junho de 2010
CCBNB para crianças
Sábado passado fui ao passeio do CCBNB para Barbalha com um mói de crianças. Isso me fez lembrar de como eu fui uma criança privilegiada. A memória inundou o presente. Fui acometido por um fluxo de consciência instantâneo.
Lembrei que...
Aos 8 anos minha mãe me presenteou com uma adaptação super-ilustrada da obra de JONATHAN SWIFT. Mal sabia eu que aquele era um dos maiores escritores ingleses de todos os tempos.
Com 11 anos o primeiro livro que eu peguei numa biblioteca foi um fantástico EDGAR ALLAN POE. Eu nunca lia e odiava os paradidáticos da escola – sempre me pareceram primários.
Com 12 minha irmã mais velha me levou pra ver a última exposição em vida de ZENON BARRETO no salão de Abril.
Aos 13 já havia assistido alguns clássicos do Cinema como “Singin in the rain”; Vertigo; “Cinema paradiso”; “Gone with the Wind”; Bem Hur; Romeu e Julieta de Fanco Zeffireli, etc.
Com 14 também caíram nas minhas mãos, por acaso (?) JOHN FANTE E CAIO FERNANDO ABREU [mas, como disse em outro momento, ainda não estava preparado para eles]. Nesta época eu colecionava trechos de VINÍCIUS DE MORAES e lia a sua excelente biografia feita por RUI CASTRO.
Do meu Pai herdei a paixão pela música popular brasileira. Em especial o tropicalismo.
Da minha mãe a paixão pelo cinema, em especial os musicais da Metro que assistíamos no corujão e na sessão de gala [eu estudava à tarde].
Da minha irmã mais velha a literatura e a companhia ao ouvir as coleções de histórias nos disquinhos coloridos [até hoje um dos meus maiores prazeres é uma boa leitura dramática. Em especial em particular].
Lembro que foi por essa época, quando uma base estética já se esboçava que o CCBNB de Fortaleza foi inaugurado. E foi lá que [re]descobri a obra de nomes (alguns impronunciáveis) que eu lia desenhados na minha colcha de cama antes de dormir quando criança: MOZART, BEETHOVEN, TCHAIKOVSKY, CHOPIN, BACH, ETC.
Tudo isto eu lembrei no caminho para Barbalha ao ver aquele mói de crianças que tem a oportunidade de ter acesso a diversos patrimônios da cultura dita universal e local sem a coleira da escola. Espontaneamente. Mas claro, tal acesso precisa ser orientado em um primeiro momento. Contudo, a abertura ao acaso parece ser o que marca e permanece. Como quando você é encontrado por um livro. Felicidade clandestina.
Meu encontro com Liv Sovik
Há uns quatro anos, quando eu ainda era estudante do mestrado, Alexandre, o Barbalho (meu orientador) me falou de um jantar no qual participara recentemente com Stuart Hall e a organizadora de sua obra no Brasil [amiga também de Heloisa Buarque de Hollanda] Liv Sovik. Achei tudo espetacular, os diálogos, as impressões do Barbalho, as descrições de Hall, etc.
Como o mundo é vasto, mas possui muitas esquinas eis que, ainda por intermédio do orientador, minha pesquisa foi inscrita na Compós 2009 PUC/Minas [eu nem sabia o que era compós] , et voilá! Meu trabalho foi selecionado [!] e financiado [!] para apresentação.
Cousas da compós
Chego esbaforido, atrasado na PUC. Só consegui participar do último dia de trabalhos após fazer o trajeto JDO – BSB- BH. E atrasado também por conta do frio gostoso que num dava vontade de sair da cama do quarto de hotel. Vencendo o sono e cansaço chego à reunião do grupo e quem está lá? Liv Sovik coordenando os trabalhos. Reconheço-a pelas fotos pesquisadas no Google. Aquela mulher excessivamente branca, sotaque impraticável. Durona, perfeccionista, inglesa. A estrangeira pesquisadora da tropicália. Me sinto nervoso, sei que estou em um momento especial. Olho ao redor e todos são ilustres desconhecidos pra mim que não sou [ou não era] originário daquele campo de estudos.
Liv Sovik: pontualidade inglesa
Os temas antes da minha exposição são coisas como: a influência da estética Road Movie nas séries brasileiras, a convergência midiática nos produtos do núcleo Guel Arraes, a contribuição de Pierre Bourdieu para crítica literária central e periférica, etc.
Apresento minha pesquisa: mídia, cultura, política, Hannah Arendt. Começo acuado. O seletíssimo público parece gostar, faz ponderações acerca do articulação com o pensamento de Hannah, da formação do espaço público, do agendamento de pautas, etc. Relaxo mais. Pareço ter feito sucesso.
Antes de sair da sala para o intervalo peço para Liv autografar meu “Da diáspora”. Saio.
No intervalo para o café o Barbalho me apresenta a vários congressistas. Digo que venho de Juazeiro do Norte, os olhos das pessoas se avivam e percebo que isto soa exótico.
Na volta à sala da confraria, a surpresa. Meu trabalho tinha recebido a “menção de destaque”. Eu não fazia idéia do que isto significava mas a cara de grata surpresa e satisfação do Barbalho dava a pista. Eu, um estreante. Na verdade só depois eu percebi o que era aquele evento. O top da produção em Mídia no Brasil. E lá estava eu, que nem era da comunicação, levando a menção de destaque.
Ao final da reunião Liv me devolve o livro e pergunta porque eu ainda não estava no doutorado. Agradeço falo do meu interesse e planos para o futuro. No despedimos. Ela, sempre séria, diz que tinha gostado da minha investigação. Quase morro nesta hora.
Depois: só festa e overdose de arte contemporânea em Inhotim com Barbalho e Bia
Na volta para o hotel abro o livro e lá está escrito: “Foi um prazer conhecer um pouco do seu trabalho de observação e reflexão. Um abraço”. Prazer! Saímos felizes para beber no local onde o “Clube da esquina” se reunia.
Como o mundo é vasto, mas possui muitas esquinas eis que, ainda por intermédio do orientador, minha pesquisa foi inscrita na Compós 2009 PUC/Minas [eu nem sabia o que era compós] , et voilá! Meu trabalho foi selecionado [!] e financiado [!] para apresentação.
Cousas da compós
Chego esbaforido, atrasado na PUC. Só consegui participar do último dia de trabalhos após fazer o trajeto JDO – BSB- BH. E atrasado também por conta do frio gostoso que num dava vontade de sair da cama do quarto de hotel. Vencendo o sono e cansaço chego à reunião do grupo e quem está lá? Liv Sovik coordenando os trabalhos. Reconheço-a pelas fotos pesquisadas no Google. Aquela mulher excessivamente branca, sotaque impraticável. Durona, perfeccionista, inglesa. A estrangeira pesquisadora da tropicália. Me sinto nervoso, sei que estou em um momento especial. Olho ao redor e todos são ilustres desconhecidos pra mim que não sou [ou não era] originário daquele campo de estudos.
Liv Sovik: pontualidade inglesa
Os temas antes da minha exposição são coisas como: a influência da estética Road Movie nas séries brasileiras, a convergência midiática nos produtos do núcleo Guel Arraes, a contribuição de Pierre Bourdieu para crítica literária central e periférica, etc.
Apresento minha pesquisa: mídia, cultura, política, Hannah Arendt. Começo acuado. O seletíssimo público parece gostar, faz ponderações acerca do articulação com o pensamento de Hannah, da formação do espaço público, do agendamento de pautas, etc. Relaxo mais. Pareço ter feito sucesso.
Antes de sair da sala para o intervalo peço para Liv autografar meu “Da diáspora”. Saio.
No intervalo para o café o Barbalho me apresenta a vários congressistas. Digo que venho de Juazeiro do Norte, os olhos das pessoas se avivam e percebo que isto soa exótico.
Na volta à sala da confraria, a surpresa. Meu trabalho tinha recebido a “menção de destaque”. Eu não fazia idéia do que isto significava mas a cara de grata surpresa e satisfação do Barbalho dava a pista. Eu, um estreante. Na verdade só depois eu percebi o que era aquele evento. O top da produção em Mídia no Brasil. E lá estava eu, que nem era da comunicação, levando a menção de destaque.
Ao final da reunião Liv me devolve o livro e pergunta porque eu ainda não estava no doutorado. Agradeço falo do meu interesse e planos para o futuro. No despedimos. Ela, sempre séria, diz que tinha gostado da minha investigação. Quase morro nesta hora.
Depois: só festa e overdose de arte contemporânea em Inhotim com Barbalho e Bia
Na volta para o hotel abro o livro e lá está escrito: “Foi um prazer conhecer um pouco do seu trabalho de observação e reflexão. Um abraço”. Prazer! Saímos felizes para beber no local onde o “Clube da esquina” se reunia.
sábado, 19 de junho de 2010
Sem Pinter nem Saramago, Blues
Quando eu estava começando a me recuperar do luto pela partida de Harold Pinter. Morre Saramago.
Harold Pinter
"Quando olhamos um espelho, pensamos que a imagem à nossa frente é exacta. Mas basta movermo-nos um milímetro e a imagem altera-se. Aquilo que estamos realmente a ver é uma série infindável de reflexos. Mas às vezes o escritor tem de quebrar o espelho – porque é do outro lado do espelho que a verdade nos espera de frente." - Pinter no dicuros de recebiment do Nobel em 2005.
Saramago: o quebrador de espelhos.
Harold Pinter
"Quando olhamos um espelho, pensamos que a imagem à nossa frente é exacta. Mas basta movermo-nos um milímetro e a imagem altera-se. Aquilo que estamos realmente a ver é uma série infindável de reflexos. Mas às vezes o escritor tem de quebrar o espelho – porque é do outro lado do espelho que a verdade nos espera de frente." - Pinter no dicuros de recebiment do Nobel em 2005.
Saramago: o quebrador de espelhos.
quinta-feira, 17 de junho de 2010
Champanhe e cicuta
Lendo a Bravo especial CAZUZA lembrei dum texto meu publicado no blog do Crato que celebra (e defende)o poeta maldito:
Em defesa do poeta
Essa velha mania nossa de querer um bode expiatório, um cordeiro para ser imolado. Para se dizer: “vejam a culpa está aqui!”.
Não posso me furtar de dar opinião sobre o artigo da psicóloga K. ao ver o filme “Cazuza, o tempo não para”. Compreendo e compartilho de muitas preocupações da Doutora, pois tenho uma irmã em plena adolescência. Entretanto, o que K. chama de “coragem” me parece mais desinformação ou ausência de acuidade estética ao ratificar as palavras do Juiz Darlan sobre o poeta que revolucionou mais que a música, a literatura popular Brasileira.
Cazuza, como homem de seu tempo, atingiu picos de genialidade onde poucos, pouquíssimos estiveram. Só comparável aos outros gigantescos de sua geração como Ana Cristina César e Torquato Neto. Então “vamos pedir piedade, Senhor piedade”. Ok, ele era burguês. Ok ele teve momentos menos inspirados (“sou rico mas sou artista”). Mas isso não o desqualifica como, nas palavras de Caetano, o maior poeta e um dos maiores narradores dos anos 1980.
Caio e Cazuza: dois grandes narradores dos anos 1980
Homem das letras, Cazuza mostrou que genialidade não tem origem social, nem idade e com suas antenas afiadíssimas captou a vida nua, “escrota e deslumbrante”. Percebeu o desencanto dos grandes movimentos sociais (“meu partido é um coração partido”), a ressaca da liberação sexual dos anos 1970 (“eu vi a cara da morte e ela estava viva”) e a desigualdade de classe ( “num trem pras estrelas, depois de navios negreiros outras correntezas”). Mas claro que numa sociedade onde tudo é esperado de forma pronta e acabada para ser consumido sem conflitos nem contradições Cazuza está por fora. Numa sociedade onde esperam ilusórias soluções mirabolantes e definitivas [e moralistas] para as mazelas sociais Cazuza é apenas mais um marginal. Porque o poeta atormenta, faz pensar, exige raciocínios que não sejam rasos. E nos mostra: não há soluções fáceis.
Num mundo anestesiado pelo consumo também fácil, sentir faz medo. Queremos coerência. Tudo lavado e perfumado (mais uma vez, digo) pronto para ser consumido, descartável e livre de contradições. Uma sociedade anestesiada pelo Prozac, por auto-ajuda ou pela crença no recrudescimento da violência do Estado.
Claro, não há de se fazer vista grossa para as drogas. Mas elas não estariam inseridas numa dinâmica bem maior e mais complexa? Dinâmica na qual se pretende a todo custo preenchendo uma espécie de vazio cavado pela solidão do homem contemporâneo? O impulso do consumo do crack não parece semelhante aos nossos impulsos diante de uma vitrine de Shopping? Me parece assustador quando queremos substituir a nata de nossos pensadores por slogans de COMERCIAL de carro. Por favor, mais Platão menos consumo. Além do mais, em que medida o tráfico de drogas se torna fundamental para a manutenção do capital? São questões grandes que transcendem Cazuza. Mas reduzir Cazuza a Fernandinho Beira Mar é desqualificar uma das poucas áreas da vida que continuam resistindo ao Capital e à mercantilização das relações: a arte. Como dizia o filósofo Italiano Benedetto Croce “a arte é educadora enquanto arte e não enquanto arte educadora”. Nada de amarras para a arte. Sem didatismos. Vida longa a Cazuza. “Dia sim dia não eu vou sobrevivendo sem um arranhão da caridade de quem me detesta”.
Alexandre Sousa. Professor, Mestre em Políticas Públicas.
(Originalmente publicado no Blog do crato: http://blogdocrato.blogspot.com/2009_11_26_archive.html)
quarta-feira, 16 de junho de 2010
Quero Virgínia, quero Quentin e quero Bivar.
Degusto com cuidado e carinho os diários de Antônio Bivar sobre suas experiências de visita às memórias do Bloomsbury entre 1993 e 2004 na Inglaterra. Estou capturado e é possível que este blog se torne nos próximos dias/ semanas um relato sobre as minhas viagens nos relatos do escritor apaixonado, assim como eu, por Virginia Woolf.
Estou apenas na 43 das mais de 500 páginas da obra e já deu pra sentir o impacto. Bivar te transporta numa leitura leve e ao mesmo tempo segura, sobre impressões e conceitos, etnografia sentimental e análises cirúrgicas. Sinto um misto de inveja e maravilhamento. Como no trecho em que narra seu primeiro [e raro] encontro com Quentin Bell ainda em 1993. Transcrevo uma parte:
Ao passar pela sala e avistar a mítica figura de Quentin Bell, sentado em sua poltrona, senti uma fortíssima emoção [...] Foi uma visão rápida e impactante [...] apresentei-me como o único latino-americano do grupo. Contei que a biografia dele sobre Virgínia tinha uma boa tradução brasileira e Quentin, com a discreta modéstia dos superiores, disse que sabia que os livros de Virginia estavam traduzidos em português [...] Quentin está com 83 anos [...] Ele, filho de duas figuras formadoras do Boomsbury, crescido no coração dessa matéria, parecia não sacralizá-la. O tempo todo ironiza, como que para nos fazer ver que ninguém era excepcional [...] Na despedida segurei a mão dele e ele apertou gentilmente a minha. Ficamos assim de mãos dadas, olhos nos olhos e, muito emocionado, falei que ia voltar para o Brasil mais feliz por tê-lo conhecido, ele abriu um sorriso de surpresa [...] Deixei a casa dos Bells como quem acabava de passar por uma experiência divina” (p. 34- 36).
Os trechos estão editados para não tirar o prazer de quem se interessar pela leitura na íntegra. Mas é incrível como o universo do Bloomsbery, e de Virginia em particular, leva a gente a um auto-fluxo de consciência. Imediatamente me lembrei de um trecho de um texto meu sobre o Caio em que eu dizia:
“Morangos Mofados. Seco assim: sem referências a autor, nem editora. Nada. Sem Caio: Sem a Clarice Lispector que ouviu muito Rock e tomou algumas drogas. Sem as bad trips, sem as cartas, sem dragões, sem a prisão por roubar na Inglaterra os dois volumes da biografia de Virginia Woolf (aliás também, ainda não havia para mim Virginia Woolf) escrita por Quentin Bell.” (Texto “morangos nervosos” disponível no overmundo.com.br).
[Breve parêntese: Caio, apelidado por Bivar como “um príncipe normando”, em seu auto-exílio na Inglaterra durante os anos de 1970 foi preso por roubar numa livraria, como disse acima, o livro redigido pelo biógrafo-sobrinho de Virgínia. Este relato pode ser encontrado tanto na compilação de cartas do escritor gaúcho organizada pelo Ítalo Moricconi como de forma friccionada no conto “lixo e purpurina” da obra “ovelhas negras”. Desde então, ainda segundo uma das cartas, Virginia Woolf passou a ser a “madrinha” de Caio, recebendo diversas homenagens em seus textos e vida. Por exemplo, as personagens Márcia Felácio e Patrícia do romance “Onde andará Dulce Veiga” acreditam ser a reencarnação de Virgínia e Katharine Mansfield. Sem falar que por aquela época a máquina de escrever de Caio também se chamava Virginia Woolf, como nos informa uma crônica de Luis Fernando Emediato publicada em “A grande Ilusão”.]
E lembrei ainda de um textinho bem insipiente que escrevi há uns dois anos quando comecei a me envolver com Mrs. Woolf e seu bando:
Bloomsbury, Bush e a Carapinima: http://publicoflutuante.blogspot.com/2008/10/bloomsbury-bush-e-carapinima.html
Bloomsbury: Bairro no Centro-oeste de Londres que deu origem ao célebre grupo com o mesmo nome. Era um ponto de encontro entre intelectuais, escritores e artistas na primeira metade do século XX.
Trilha Sonora da leitura: Carla Bruni CD “No promeses”
terça-feira, 15 de junho de 2010
Pela mão de Tim Burton
Eu juro que, como todo mundo detonou Alice, fui pronto para ADORAR a produção de TIM Burton. Isso não aconteceu. Mas também não é algo a ser recusado em bloco. Não farei coro com os detratores do diretor de “Os-fantasmas-se-divertem-besouro-suco”.
O que me desagradou e preocupou de início foi certa obviedade em termos de referências. Primeiro me senti meio constrangido com aquela sutura que ficou no meio do caminho entre “My fair Lady” e a história "infantil". Depois tem cenas paupérrimas como a de Alice querendo ser “livre” e olhar didaticamente para uma revoada de pássaros (neste momento me contorci na poltrona). Algumas “rasidades” nas discussões de Machiavel “Ser temido ou ser amado”; Citações a Wilde e a noção de normalidade. Tudo isso me fez sentir mais diante da Rose/Kate Winslet de Titanic do que da menina de Lewis Carroll.
Alice ou Rose no estilo eu_quero_ir_minha_gente_eu_não_sou_daqui
Mas gostei de algumas coisas: as referências à “história sem fim” [filme que sempre imprimiu em mim um medo pânico. Já imaginou uma coisa que não tem fim fim nem começo? Como disse Clarice em "água viva"].
Destaque para a rainha de copas, marcação muito boa. Caricatura na medida. Os contrapontos dark à uma história supostamente infantil [o batom negro da rainha banca, as cores meio encardidas. Os vermelhos-meio terra. E aquela mesma rainha branca meio drogada por algo como lexotan, diazepan ou canabis mesmo.
Outro aspecto é que sou particularmente seduzido por histórias com oráculos/destinos [até porque estudo um: oI Ching. Isto me instiga muito.]
De mais a mais a única coisa que achei irritante e ultra clichê, posso dizer que foi a única coisa que odiei, foi a TRILHA SONORA. HOR-RO-RO-SA. Me senti num filme de temperatura máxima. Mais obviedade impossível. E fiquei lembrando da excelente coletânea de ensaios chamada “Criando Kane” da crítica Pauline Kael, quando ela desmascara a interferência dos produtores de Hollywood na criação dos diretores. Fico pensando até que ponto Burton teve que fazer concessões para esta Alice. E talvez o título deste post não devesse nem ser "pela mão de Alice", nem "pela mão de Burton", mas "PELA MÃO de Disney".
O que me desagradou e preocupou de início foi certa obviedade em termos de referências. Primeiro me senti meio constrangido com aquela sutura que ficou no meio do caminho entre “My fair Lady” e a história "infantil". Depois tem cenas paupérrimas como a de Alice querendo ser “livre” e olhar didaticamente para uma revoada de pássaros (neste momento me contorci na poltrona). Algumas “rasidades” nas discussões de Machiavel “Ser temido ou ser amado”; Citações a Wilde e a noção de normalidade. Tudo isso me fez sentir mais diante da Rose/Kate Winslet de Titanic do que da menina de Lewis Carroll.
Alice ou Rose no estilo eu_quero_ir_minha_gente_eu_não_sou_daqui
Mas gostei de algumas coisas: as referências à “história sem fim” [filme que sempre imprimiu em mim um medo pânico. Já imaginou uma coisa que não tem fim fim nem começo? Como disse Clarice em "água viva"].
Destaque para a rainha de copas, marcação muito boa. Caricatura na medida. Os contrapontos dark à uma história supostamente infantil [o batom negro da rainha banca, as cores meio encardidas. Os vermelhos-meio terra. E aquela mesma rainha branca meio drogada por algo como lexotan, diazepan ou canabis mesmo.
Outro aspecto é que sou particularmente seduzido por histórias com oráculos/destinos [até porque estudo um: oI Ching. Isto me instiga muito.]
De mais a mais a única coisa que achei irritante e ultra clichê, posso dizer que foi a única coisa que odiei, foi a TRILHA SONORA. HOR-RO-RO-SA. Me senti num filme de temperatura máxima. Mais obviedade impossível. E fiquei lembrando da excelente coletânea de ensaios chamada “Criando Kane” da crítica Pauline Kael, quando ela desmascara a interferência dos produtores de Hollywood na criação dos diretores. Fico pensando até que ponto Burton teve que fazer concessões para esta Alice. E talvez o título deste post não devesse nem ser "pela mão de Alice", nem "pela mão de Burton", mas "PELA MÃO de Disney".
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