domingo, 17 de agosto de 2008
Adoro esse texto "QUER DIZER QUE NÃO TEM PINBALL?"
Coisas limpinhas e corretinhas estão na moda, e isso é horrível. Descobri da última vez que quis jogar fliper. Foi assim: botei cinco dinheiros no balcão e pedi (com educação): “Moço, me vê dez fichas”. O sujeitinho me mediu e perguntou: “Fichas, como assim?”. Vi que ele era folgado demais para alguém tão pequeno (vááários centímetros a menos que eu), mas ainda estava calma e expliquei didaticamente: “ficha para jogar, ué não está escrito ‘games’ ali na placa?”. O puto deu uma risadinha arrogante e disse: “Não, aqui é lan house (oh merda!), você pode estar jogando no computador (depois de algumas vodcas a gente vê umas luzes e lê ‘videogame’ e já acha que é fliperama, quem vai pensar que é uma dessas putices de lan house) e blablabla”. Comecei a pensar, o mundo está perdido mesmo. Alguém me explica qual é a graça de 1) pagar caro (o fliper custa 50 cents); 2) jogar sentado (no fliper,a graça sempre foi chutar a máquina, ou melhor; foder a máquina).
Maldita assepsia do ocidental moderno. Tudo tem que ser limpinho e controlado, sem erro, sem riscos. Resultado? Comida sem gosto, carne de plástico, gente de plástico, rock de mentirinha, raciocínios rasos, óbvios e livres de contradições, tudo bem bonitinho, confortável e feliz, pronto para ser comprado. No alarms and no surprises. Mas se não há possibilidade de erro, não há necessidade de enfrentar novas soluções, logo não há criatividade.Vida longas ás coisas sujas, complicadas, às paixões descontroladas, às contradições, aos problemas e a tudo o que for imprevisível. Humanidade imprevisível e não maquinalmente planejada. Nada de sistematizar a vida, pensando como máquinas. Máquinas (de pinball, pelo menos) servem pra gente chutar num jogo exaltado, e ponto final.
Ana Pands
(Revista MTV, Nº 45, fevereiro de 2005)