sexta-feira, 7 de novembro de 2008

Literatura pra rir e odiar

Caio Fernando Abreu dizia que o maior castigo a um personagem ingrato é condená-lo ao fundo de gaveta. Foi o que fiz com a impossível “Janey Wilcox”, personagem que dá nome ao romance da escritora norte-america Candance Bushnell (nunca acerto o nome dessa mulher), autora do best-selller, que virou série (de 6 temporadas) e filme: “Sex and the city”.

(um calhamaço chamado Janey Wilcox)
Não vou discutir a qualidades literárias de Bushnell, pois sua literatura é assumidamente comercial e integra aquele hall de escritos feitos por Hellen Fielding (autora de “o diário de Bridget Jones)e Armistead Maupim (autor magnífica série de seis volumes de “Histórias da cidade” sobre a cidade de São Francisco pós-revolução sexual). Ou seja, aquele tipo de livro capaz de te arrancar boas gargalhadas e que são quase roteiros televisivos ou de cinema. Livros para serem lidos desprentenciosamente, por que, provavelmente, não te oferecerão mais que isso. A não ser que você seja um louco, como eu, que publica um artigo científico no (III ENECULT) citando,de cara, Bridget Jones. Quer conferir? Vide:

http://www.cult.ufba.br/enecult2008/14385.pdf

Pois bem, Wilcox é uma bem sucedida modelo norte-americana cuja beleza poderia ser resumida da seguinte forma:

“tinha aquele ar de bondade deliberada combinando com um distanciamento mundano que é a marca das pessoas cuja beleza as destacou do resto da humanidade” (p. 68)”.

(eis minha Janey Wilcox: Nicole Kidman)
Janey faz qualquer coisa para subir na vida. Poderia resumi-la também desta forma. Mas não é só isso, no livro Candance Bushnell disseca e mostra que conhece como ninguém o Ethos da High Socity nova-iorquina, seus fins de semana nos Hemptons, como também suas senhas: sejam os produtos de grife ou a velha pose pseudo-blasé, mas que, se vista bem de perto, é completamente planejada e FAKE.

Aliás Fake poderia ser o nome do romance. Nada do que os personagens pensem, façam ou digam é real. Tudo sempre milimetricamente planejado, frívolo e no CARÃO:

“Afastando-se da multidão por um momento, Janey se colocou na sua melhor pose [...] Inclinou ligeiramente a cabeça para trás e fechou os olhos, respirou o ar noturno, consciente de que, enquanto fazia isso, está criando a impressão de uma linda jovem perdida em pensamentos. Só que na realidade sua cabeça está a mil” (p.40).

No começo estas atitudes da senhorita Wilcox são engraçadas e podemos até, de certa forma nos identificar um pouco com elas (só de certa forma), mas as páginas vão avançando e você começa a se irritar. Nada é de verdade. E pior, Janey é uma psicopata capaz de destruir a vida de quem se deixar sugar, como acontece com irmã, o amigo escritor, etc. Sem remorsos ela segue em frente com suas bolsas Luis Vuiton.

Aliás lendo o livro fiquei me perguntando se a autora recebeu algum cachê para citar tanta marca famosa: Christian Dior, Prada, Dolce e Gabbana, Yves Sant Laurent, Versace e por aí vai.

Ok, ok então você me inquiriria: se é tão ruim assim, porque gastar tempo lendo as mais 500 páginas de futilidade e ostentação burguesa? Ou ainda... Porque macular a “seriedade” de um blog com esse lixo comercial?

Aceito o desafio, coloco os óculos, e pseudo-intelectual, na melhor postura Janey Wilcox, profiro: na verdade Janey Wilcox, o livro, pode ser lido como uma etnografia-ficcional daquele universo apresentado pelo sociólogo americano Richard Sennet em seu OBRIGATÓRIO ensaio: “A corrosão do caráter”. Aqui dá para visualizar diversas passagens relatadas pela pobre Rose no capítulo “Risco” e “a ética do trabalho” de Sennet. Não acreditas? Transcrevo uma comparação:

Fala de Rose no sério livro de Sennett : “Eu pedi demissão porque tinha a impressão de que não saía do lugar. Eu nunca era chamada para as reuniões e happy hours após o expediente. E todo mundo sabe que é neste momento em que as coisas acontecem” - cito de cabeça

Fala da narradora do frívolo livro de Bushnell: “Nem sempre as informações é que eram importantes (erro que maior parte das pessoas cometia), mas sim o ato de recebê-las” (p. 55).

Tiro os óculos: contudo, tentar dar dignidade à leitura do livro fazendo paralelos sociológicos não justifica sua leitura até o fim. Na verdade Janey te seduz, ou pelo menos me seduziu, até o momento em que na página 466, faltando apenas 40 para acabar, decido romper com Wilcox. Me sinti usado, usurpado e indignado diante da falta de remorsos da garota, após destruir a carreira, a duras penas, erigidas pelo personagem que mais “simpatizei”: o escritor Craig.

Fecho Wilcox, abandono na prateleira, não serei platéia para ela, para seu gand filane.

Entretanto, cá estou eu, escrevendo sobre ela.